quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Carioca com alma pernambucana

Quem nasce em terra tupiniquim carrega a sina de ter a alma pernambucana.  Ô, sorte! O estado que deu asas para a sanfona de Luiz Gonzaga e criou Chico Science, Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Capiba, Naná Vasconcellos, Siba, Karina Buhr, Lenine, Lia de Itamaracá, Antônio Nóbrega, Lula Queiroga, Otto, entre muitos outros, é a cor do nosso país.

Quando fala-se de cinema nacional, também é impossível não lembrar de Marcelo Assis, Heitor Dhalia, Marcelo Gomes, Lírio Ferreira, Guel Arraes, João Falcão... todos pernambucanos. No carnaval, por mais que o Rio de Janeiro tenha seu valor inquestionável de sambas e marchas, Recife, Olinda e a Zona da Mata nos trazem os maracatus, os frevos. O agreste do estado foi berço do baião e do xaxado.

Parece que entre as ladeiras de Ó, linda, os canais da Veneza brasileira e o Marco Zero existe uma fábrica de talentos. Os prédios arranha-céus, o sotaque carregado, povo que diz o que de fato pensa, abre as portas da sua casa e tem mania de criar. No mar de Boa Viagem muita gente da melhor qualidade se banhou. No sertão de Pernambuco, muitos outros maravilhosos brasileiros já lamentaram a falta de chuva e colocaram a dor em forma de melodia em uma velha sanfona.

Para afastar o calor, nada melhor do que se banhar na Ilha de Itamaracá e, depois, unir as mãos na ciranda de Lia. As ondas vêm e vão, o sol cai, a magia continua. Os mangues também são artistas. O cinema de lá vai mais fundo na alma, não vê apenas o conflito óbvio, a desigualdade: as telas pernambucanas refletem o ser humano em seu estado mais sombrio, sólido e fluído; os questionamentos, a dor, a (des)construção.

Enquanto o carnaval se aproxima, e o sonho de cruzar os Quatro Cantos aumenta, a certidão carioca fica cada vez mais de lado e doida para partir rumo ao nordeste. Dá vontade de sair gritando como bom fã do Original Olinda Style: "é de fazer chorar, quando o dia amanhece e obriga o frevo acabar"... Porém, ao cair na real, lembro-me que a distância entre as capitais é de quase 2 mil quilômetros. Por mais que a paixão pela arte una Rio e Recife, a proporção continental do nosso país os separa. Desta forma, sem passagem, sem moradia, resta-me cantarolar no pré-carnaval: "quando eu me lembro que o Recife tá longe, a saudade é tão grande, que eu até me embaraço".

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Le prénom / Qual é o nome do bebê?


Uma comédia sobre os laços familiares cai muito bem, ainda mais quando o filme explora os momentos mais simples das relações, como um encontro casual, e o desnuda em complexas camadas, sem perder a leveza - jamais!

A interação humana, os relacionamentos, até mesmo entre os mais próximos, estão sempre fadados ao fracasso. Não ao fracasso eterno, mas, sim, aos conflitos diários, às contradições, aos desgastes. Cada um tem o poder de interpretar a voz do outro da maneira que bem entender, a partir de suas singularidades. Assim, qualquer palavra, frase, brincadeira pode soar muito mal ao ouvido de alguns.

Desta maneira, uma simples piada sobre o nome do filho e o encontro para anunciar essa escolha acaba abrindo as cortinas para a desordem que há em toda a família, porém, que é - quase sempre - deixada de lado, tornando-se obscura. Um filme despretensioso, que se passa entre as paredes de um apartamento familiar explora o interior de cada um de nós.

É impossível não nos identificar com as dificuldades, incompreensões e falta de diálogo das relações entre os personagens. O ambiente familiar acentua - através da proximidade dos laços sanguíneos e uma certa intimidade entre os membros da linhagem - os defeitos dos homens. Na intimidade somos tão dramáticos, fechados em nosso próprio mundo, que mal conseguimos enxergar nossos irmãos. Assim, através do excesso, da discussão, do descontrole e do drama, "Le prénom" escancara a comédia da convivência humana. Afinal, problemas e diferenças todos nós temos, basta procurar a melhor forma de encarar as disparidades: o filme sugere de forma interessante o riso como saída.